No dia de hoje (29/03), aconteceu em Estrasburgo o julgamento de dois importantes casos em matéria climática: o Caso Verein Klima Seniorinnen Schweiz e outros vs. Suíça; e o Caso Carême vs. França. No primeiro, as principais alegações foram: a violação dos art. 2 (direito à vida) e 8 (direito ao respeito pela vida privada e familiar) da Convenção Europeia de Direitos Humanos; violação arbitrária do art. 6 pela Suprema Corte Suíça; e a violação ao art. 13, no que se refere ao direito a um recurso efetivo (effective remedy). 

Após a abertura da sessão de julgamento pela presidente O’LEARY, o governo Suíço iniciou a sua defesa, afirmando não reconhecer as violações alegadas pelas vítimas e de que as suas emissões são inferiores à média internacional. Entre as principais teses sustentadas, são a de que as emissões alegadas estão além da jurisdição do país, e que, portanto, as emissões de gases produzidas no exterior não devem fazer parte do litígio. Também foi alegado que as requerentes não se qualificam como vítimas, nos termos da convenção, porque a Associação Klimaseniorinnen não pode ser compreendida como tal. Desta forma, no que concerne o nexo causal, o governo alegou que as vítimas deveriam ter demonstrado que foram pessoalmente e diretamente afetadas, não cabendo “mera suspeita” neste contexto, e tampouco a assunção de que a ideia de “vulnerabilidade” seja suficiente para ser considerada como vítima perante à Corte. Por fim, o governo relembra que o mecanismo de controle de convencionalidade da Corte não aceita a actio popularis, não tendo as requerentes sido afetadas o suficientemente para serem considerados como vítimas, e, se assim o fossem, o governo refutou o quantum inicialmente pedido, pleiteando uma redução para a quantia de 13.000 CHF. 

As requerentes, por sua vez, relembraram que os direitos de todas as pessoas e das futuras gerações serão afetados diante da iminência da irreversibilidade dos danos causados até então, e de que é preciso responder os fatos científicos com ações, de maneira que cada instituição tem responsabilidade e deve agir para mitigar possíveis danos. Foi alegado que a Suíça falhou em tomar as medidas necessárias para mitigar as mudanças climáticas e reduzir suas emissões, e no que concerne ao status de vítimas, as requerentes relembraram que os idosos e mulheres idosas são mais vulneráveis ao aquecimento global e às ondas de calor, e de que, a actio popularis não deve ser rejeitada, porque cada uma das pessoas é individualmente afetada, e que os Estados têm uma obrigação positiva de proteção, independentemente se o dano climático foi causado por agentes públicos ou privados. Por fim, foi alegado que o Estado falhou nas suas medidas de mitigação, e que o Acordo de Paris é um acordo internacional para prevenir as mudanças climáticas e as violações de direitos humanos por elas acarretadas, havendo necessidade de tomar medidas urgentes para proteger estes direitos, em razão do dever de diligência. As requerentes ainda alegaram que a doutrina da margem de apreciação não pode ser utilizada para reduzir as metas firmadas. 

Após as alegações iniciais do governo Suíço e das requerentes, a sessão seguiu com a intervenção do governo Irlandês, e, posteriormente, com a fala da representante das Instituições Nacionais Europeias de Direitos Humanos (European National Human Rights Institutions), que destacou o estado de emergência climática que estamos vivendo, bem como os impactos que a decisão da Corte poderá ter sobre o exercício dos direitos humanos, bem como sobre a transparência e participação pública em matéria climática. 

Após, os juízes conduziram uma série de perguntas, afim de clarificar os argumentos trazidos pelas partes, que foram respondidos pelo governo Suíço e pelas requerentes. A presidente, então, encerrou a questão, concedendo prazo às partes para responder às perguntas remanescentes. 

O caso em questão é um marco para os litígios climáticos na Corte Europei a, tendo em vista que é o primeiro julgamento de tal tipo, e que pode inaugurar um regime de responsabilidade dos Estados por omissões no que concerne à ação climática. Apesar das alegações serem fundamentadas nos dispositivos da Convenção Europeia de Direitos Humanos, inegavelmente, o caso relaciona-se com o Acordo de Paris, já que as alegações e questionamentos são provenientes da omissão Suíça em adotar medidas mais ambiciosas e adequadas de adaptação e mitigação, posto que as mudanças climáticas afetam diretamente o acesso e exercício dos direitos humanos, sobretudo, pelas populações mais vulneráveis. Espera-se que a sentença venha a reconhecer a causalidade entre ação climática e os danos à saúde e vida humanas. 

Por Valéria Emília de Aquino 

Wednesday 29 March 2023, the judgment of two important cases in climate matters took place in Strasbourg: the case of Verein KlimaSeniorinnen Schweiz and Others v. Switzerland; and the case of Carême v. France. In the first, the main allegations were: the violation of article 2 (right to life) and article 8 (right to respect for private and family life) of the European Convention on Human Rights; arbitrary violation of article 6 by the Swiss Supreme Court; and the violation of article 13, regarding the right to an effective remedy.

After the opening of the trial session by President O’Leary, the Swiss government began its defense, stating that it did not recognize the violations alleged by the victims and that their emissions were lower than the international average. Among the main theses supported are that the alleged emissions are beyond the jurisdiction of the country, and that, therefore, gas emissions produced abroad should not be part of the litigation. It was also alleged that the applicants do not qualify as victims under the convention because the KlimaSeniorinnen Association cannot be understood as such. Thus, with regard to the causal link, the government claimed that the victims should have demonstrated that they were personally and directly affected, with “mere suspicion” not being applicable in this context, nor the assumption that the idea of ​​“vulnerability” is sufficient to be considered as a victim before the Court. Finally, the government recalls that the Court’s conventionality control mechanism does not accept the actio popularis, as the applicants were not affected enough to be considered as victims, and, if so, the government refuted the amount initially requested, claiming a reduction to the sum of 13,000 CHF.

The applicants, in turn, recalled that the rights of all people and future generations will be affected in view of the imminence of irreversibility of the damage caused so far, and that it is necessary to respond to scientific facts with actions, so that each institution has responsibility and must act to mitigate possible damages. It was alleged that Switzerland failed to take the necessary measures to mitigate climate change and reduce its emissions, and with regard to the status of victims, the applicants recalled that the elderly and elderly women are more vulnerable to global warming and heat waves , and that the actio popularis should not be rejected, because each person is individually affected, and that States have a positive obligation of protection, regardless of whether the climate damage was caused by public or private agents. Finally, it was alleged that the State failed in its mitigation measures, and that the Paris Agreement is an international agreement to prevent climate change and the violations of human rights caused by it, with the need to take urgent measures to protect these rights. , due to the duty of care. The applicants also alleged that the margin of appreciation doctrine cannot be used to reduce the established targets.

After the initial allegations of the Swiss government and the applicants, the session continued with the intervention of the Irish government, and, later, with the speech of the representative of the European National Human Rights Institutions, who highlighted the state of climate emergency we are experiencing, as well as the impacts that the Court’s decision may have on the exercise of human rights, as well as on transparency and public participation in climate matters.

Afterwards, the judges conducted a series of questions, in order to clarify the arguments brought by the parties, which were answered by the Swiss government and by the applicants. The President then closed the matter, allowing the parties time to respond to the remaining questions.

The case in question is a milestone for climate litigation at the European Court, given that it is the first judgment of its kind, and that it can inaugurate a regime of responsibility of States for omissions with regard to climate action. Despite the allegations being based on the provisions of the European Convention on Human Rights, the case is undeniably related to the Paris Agreement, since the allegations and questions arise from the Swiss failure to adopt more ambitious and adequate adaptation and mitigation measures, since climate change directly affects the access and exercise of human rights, especially by the most vulnerable populations. It is hoped that the judgment will recognize the causality between climate action and damage to human health and life.

Text by Valéria Emília de Aquino.

Translation by Guilherme Rodrigues da Silva.

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