Daniel Urias Pereira Feitoza

Alvo de diversas notícias ao redor do mundo[1], a admissão dos seis novos membros do BRICS é vista por muitos países do norte global, composto pelas nações industrializadas e economicamente avançadas do hemisfério norte, como uma ameaça ao sistema político-econômico atual. 

O BRICS é caracterizado pela diversidade de economias, culturas e sistemas políticos de seus membros, um grupo de países em desenvolvimento: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, agora incluindo Argentina, Arábia Saudita, Egito, Emirados Àrabes Unidos, Etiópia e Irã. Essas nações formam uma associação internacional que busca a cooperação econômica e política, visando influenciar questões globais e promover o crescimento mútuo. 

O primeiro passo para compreender a magnitude do desafio dos BRICS deve ser uma comparação de suas posições na economia global com as dos EUA e da União Europeia[2]. Em termos de PIB, de acordo com o poder de compra (PPC), o principal indicador de poder econômico, os BRICS formam o maior bloco econômico do mundo e um de seus membros, a China, é a segunda maior economia global.

O poderio econômico e político desses países mostram que a organização atingiu a capacidade de ter um impacto significativo no futuro do sistema econômico e político global. Desde 2020, é possível notar frequentes relatos dos esforços dos membros do BRICS para combater o aumento do uso do dólar e do sistema SWIFT pelos Estados Unidos[3]

A defesa de uma moeda alternativa ao dólar para as negociações dos membros do BRICS, embora abordada de forma tímida, fora pauta da 15ª Cúpula dos Chefes de Estado do Brics onde os membros do bloco se comprometeram a estudar formas de viabilizar uma moeda de referência para os países membros realizarem suas negociações, sendo que para este tema fora criado um grupo de trabalho para estudar as formas de adotar uma moeda comum entre os membros. 

Quanto ao dólar, desde o pós-Guerra, quando a moeda assumiu a liderança como moeda internacional dominante, tem havido inúmeras previsões de que a sua posição seria eventualmente enfraquecida ou compartilhada com outras moedas. Durante os anos 1960, o economista canadense Robert Triffin destacou as fragilidades na relação entre o dólar e o ouro[4]. Nos anos 1970, com o colapso do sistema de câmbio fixo originado pelo Acordo de Bretton Woods, surgiram especulações sobre a perda da influência global do dólar. Essa percepção ganhou força com a ascensão do marco alemão e do iene japonês nos anos 1980, além do lançamento do euro no final dos anos 1990[5].

Com a emergência da revolução digital e das rupturas geopolíticas que temos vivido, como a ascensão de moedas digitais e a guerra na Ucrânia, o debate de transformações no padrão monetário global atual vem sendo cada vez mais fortificado. No âmbito dos BRICS, é significativa a importância dos vários acordos monetários que deixam de lado o dólar, membros como a China e o Brasil decidiram liquidar suas trocas comerciais em yuan e reais; a França passou a fazer algumas transações em yuan; a Índia e a Malásia estão intensificando o uso da rupia em suas negociações bilaterais; Pequim e Moscou estão conduzindo negociações em yuans e rublos[6].

É nesse sentido que a expansão dos BRICS passa ser vista, por alguns, como uma possível ameaça à hegemonia do norte-global no cenário político-econômico atual[7]. Sobre o assunto é importante ter-se em conta que o BRICS abrange economias em crescimento, como a China e a Índia, que estão se tornando mais importantes no cenário global. Se essas nações continuarem a expandir suas economias, podem criar alternativas viáveis ao domínio econômico dos EUA e da UE. A ascensão do BRICS como um bloco econômico robusto pode levar a uma redistribuição do poder econômico global[8].

Quanto a isso, ao diversificar suas parcerias comerciais e econômicas, os países do BRICS podem reduzir sua dependência das economias ocidentais. Isso poderia enfraquecer a influência dos EUA e da UE nas políticas econômicas e comerciais globais. Todavia, os países do BRICS têm diferenças consideráveis em termos de sistemas políticos, culturas, objetivos nacionais e internacionais bem como níveis diferentes de desenvolvimento. Isso pode dificultar a cooperação total entre eles e a formação de uma frente unificada contra as potências ocidentais principalmente considerando a dependência econômica de países do norte-global, muitos membros do BRICS ainda dependem economicamente das relações com os EUA e a UE[9]. Romper completamente esses laços poderia prejudicar suas próprias economias, especialmente considerando que essas nações são importantes destinos para exportações.

Em última análise, enquanto o BRICS apresenta um desafio ao status quo da hegemonia dos EUA e da UE, essa ameaça não é necessariamente iminente ou inevitável. O BRICS enfrenta desafios internos para a cooperação efetiva e ainda mantém laços econômicos consideráveis com o Ocidente. Além disso, as potências ocidentais mantêm uma presença forte em termos militares, diplomáticos e institucionais, o que assegura sua influência além do domínio econômico.

Portanto, a ascensão do BRICS pode contribuir para um mundo mais multipolar, mas a substituição completa da influência dos EUA e da UE não é garantida, nesse sentido, é cedo para falar de pé de igualdade e oposição ao norte-global por parte dos BRICS, mas sim, a criação de uma nova alternativa para as relações internacio


[1] GRANVILLE, Samantha. Brics summit: Is a new bloc emerging to rival US leadership? CNN, News. Atlanta, 24 ago. 2023. Disponível em: https://www.bbc.com/news/world-africa-66609633. Acesso em: 30 ago. 2023.

[2] PLESSIS, Carien Du; MIRIDZHANIAN, Anait; ACHARYA, Bhargav. BRICS welcomes new members in push to reshuffle world order. Reuters Online, 24 ago. 2023. Disponível em: https://www.reuters.com/world/brics-poised-invite-new-members-join-bloc-sources-2023-08-24/. Acesso em: 30 ago. 2023.

[3] ROACH, Michael. De-dollarisation: shifting power between the US and BRICS. The Interpreter, 3 ago. 2023. Disponível em: https://www.lowyinstitute.org/the-interpreter/de-dollarisation-shifting-power-between-us-brics. Acesso em: 30 ago. 2023.

[4] KANAPI, Henry. US To Suffer Devastating Hyperinflation, War, Starvation As BRICS Dumps Dollar: Robert Kiyosaki. The Daily Hodl, 23 abr. 2023. Disponível em: US To Suffer Devastating Hyperinflation, War, Starvation As BRICS Dumps Dollar: Robert Kiyosaki. Acesso em: 30 ago. 2023.

[5] KANAPI, Henry. US To Suffer Devastating Hyperinflation, War, Starvation As BRICS Dumps Dollar: Robert Kiyosaki. The Daily Hodl, 23 abr. 2023. Disponível em: US To Suffer Devastating Hyperinflation, War, Starvation As BRICS Dumps Dollar: Robert Kiyosaki. Acesso em: 30 ago. 2023.

[6] HESSEL, Roasana; GONÇALVES, Rafaela. Lula defende moeda única para transações entre os Brics; entenda proposta. Correio Braziliense, Brasília, 14 ago. 2023. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2023/04/5087296-lula-defende-moeda-unica-para-transacoes-entre-os-brics-entenda-proposta.html#google_vignette. Acesso em: 30 ago. 2023.

[7]  PLESSIS, Carien Du; MIRIDZHANIAN, Anait; ACHARYA, Bhargav. BRICS welcomes new members in push to reshuffle world order. Reuters Online, 24 ago. 2023. Disponível em: 

[8]  PLESSIS, Carien Du; MIRIDZHANIAN, Anait; ACHARYA, Bhargav. BRICS welcomes new members in push to reshuffle world order. Reuters Online, 24 ago. 2023. Disponível em: 

[9] KHOMYAKOV, Maxim; DWYER, Tom; WELLER, Wivian. Internationalization of higher education: excellence or network building? What do BRICS countries need most? Sociologias, Porto Alegre, ano 22, n. 54, maio-ago 2020, p. 120-143.

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